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Vale da Utopia

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Texto do Juremir Machado

ACERTO DE CONTAS EM WALL STREET

– Que história é essa, Fukuyama? Não estou entendendo. Você não disse e escreveu que a história tinha acabado?– Bom, presidente Bush, isso eu peguei do Kojève. De qualquer maneira, já publiquei outro livro sustentando o contrário. Eu me enganei. A história continua.– Ah, bom? Mas desse livro ninguém ficou sabendo, então!– É, o senhor sabe, os leitores gostam de sensacionalismo. A idéia de fim da história tinha mais apelo comercial. Os marqueteiros adoravam esse conceito.– É, mas eu acreditei e deixei rolar. Achei que estava tudo dominado. Agora o Chávez fica me enviando e-mail debochado dizendo que Karl Marx me manda lembranças ou perguntando onde eu enfiei a mão invisível capitalista.– Se permite, presidente, o que o senhor responde?– Tive vontade de perguntar pela senhora mãe dele, mas me contive. Disse que ele fosse perguntar pela mão invisível do capitalismo ao Adam Smith e me deixasse em paz. Sabe o que ele respondeu? Que só conhece a mão grande do capitalismo e que eu sou o mais novo comunista global.
– É duro, presidente, mas pode ser pior. Veja o caso de Portugal e do Brasil. Tive notícias sobre esses países.– É mesmo? O Luiz Inácio vive me tocando flauta, dizendo que a crise é minha e que no Brasil está tudo numa boa, tanto que até o Timão voltará à elite do futebol em 2009.– Verdade, até certo ponto, mas, depois das estatizações de bancos que o senhor fez, o Oscar Niemayer ganhou fôlego para viver mais cem anos em defesa do comunismo e da funcionalidade de Brasília. Ninguém vai agüentar.– E em Portugal, o que pode estar acontecendo lá?– O Saramago está com a corda toda. Não pára de falar. O senhor sabe, com ele nunca tem ponto. Agora ele só sai de casa com a sua carteirinha de comunista pendurada no pescoço. Pretende escrever um 'Ensaio sobre a Cegueira II', em homenagem à revista brasileira Veja, com 700 páginas de um único parágrafo, 400 mil vírgulas, 300 mil interpolações, 2,4 mil parábolas, 25 mil metáforas e uma só mensagem: Marx vive. Parece que vai virar filme dirigido pelo filho ou neto esquerdista de um banqueiro. – Tudo bem, Fukuyama, tudo bem. Só que algum ponto positivo deve ter nessa crise, não é mesmo? Sempre tem.
– Tudo depende da maneira como se olha a coisa, presidente. O capitalismo tem um grande poder de regeneração, ainda mais quando conta com a boa vontade do Estado que tanto combate e com o dinheiro do contribuinte. É o que dizem Saramago e toda a torcida do Flamengo, do Corinthians, do Inter, do Barcelona: privatização dos lucros, socialização dos prejuízos. Enfim, parece que alguns editores estão lucrando muito com a venda do estoque encalhado do 'Manifesto Comunista'. Tem gente comprando 'O Capital' por engano. Acham que pode ser um bom manual para sair da crise.– É só isso? Não tem nada mais substancial e útil?– Bom, parece que aumentou muito a venda de gel para jornalistas neoliberais, yuppies e outros jovens lobos aspirantes que agora vivem escabelados tentando explicar tudo o que disseram, com arrogância, até o mês passado.– A que estado chegamos, Fukuyama – suspirou Bush.– Ao Estado intervencionista, presidente.– Que fazer? – Lênin, presidente, tem um livro com essa pergunta como título. Se quiser, posso emprestar-lhe o meu exemplar.– Que história é essa, Fukuyama? Tenho mais o que fazer. Ainda mais agora que vou poder voltar para o Texas.

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